Boletim Mineiro de História

Boletim atualizado todas as quartas-feiras, objetiva trazer temas para discussão, informar sobre concursos, publicações de livros e revistas. Aceita-se contribuições, desde que versem sobre temas históricos. É um espaço plural, aberto a todas as opiniões desde que não contenham discriminações, racismo ou incitamentos ilegais. Os artigos assinados são de responsabilidade única de seus autores e não refletem o pensamento do autor do Boletim.

20.6.06

Número 045


Editorial



1. Mais um convite para palestra e manhã de autógrafos, desta vez na cidade de Rio Acima. Será no próximo sábado, às 10 horas.

2. Uma pesquisa interessante foi divulgada esta semana nos principais portais da Internet. Em seis países – Brasil, Inglaterra, Canadá, Guatemala, Índia e África do Sul – foram realizadas entrevistas com 1000 pessoas. Os resultados foram bem interessantes.
- 300 pessoas disseram que nos últimos 5 anos, em algum dia, parentes ou conhecidos receberam ameaças, foram feridos ou mortos com armas de fogo. Mas não houve uma média de respostas. Enquanto em países como a Índia apenas 3% de entrevistados responderam afirmativamente, esse porcentual chegou a 51% no Brasil e na Guatemala, e 54% na África do Sul. E o mais grave, talvez, o medo de tornar-se vítima, no futuro próximo, revelou-se altíssimo. O menor porcentual foi o do Canadá, com 36%. Já no Brasil, 94% dos entrevistados acreditam que serão vítimas ou de ameaças ou de ferimentos ou de mortes por armas de fogo. Patético, não?

3. O curso de pós-graduação lato sensu História, Patrimônio Cultural e Turismo está sendo novamente divulgado. A previsão de início é para 19 de agosto, com aulas apenas aos sábados.
Dados explicativos:

Especialização em HISTÓRIA, PATRIMÔNIO CULTURAL E TURISMO

Pós Graduação Lato Sensu nos termos da resolução 01 de 03 de abril de 2001

PÚBLICO-ALVO: Profissionais de instituições culturais públicas e privadas e graduados em História, Turismo, Sociologia, Arqueologia, Arquitetura, etc.

OBJETIVOS

* Preparar profissionais para desenvolver atividades relacionadas ao Patrimônio Cultural, de maneira a viabilizar o desenvolvimento do turismo responsável e comprometido com a preservação da memória e da cultura de Minas Gerais e do Brasil,

* desenvolver habilidades e competências para elaborar e implantar projetos direcionados à preservação e à conservação do patrimônio cultural, notadamente o mineiro,

* conhecer, respeitar e fazer cumprir a legislação referente à preservação e conservação do patrimônio cultural brasileiro, em especial o de Minas Gerais,

* propor parcerias entre órgãos públicos e privados envolvidos no debate acerca do desenvolvimento de atividades de exploração comercial responsável do turismo.

COORDENAÇÃO GERAL - Mônica Liz Miranda - Mestra em História

ESTRUTURA CURRICULAR

Metodologia Científica - 60 h/a - Mônica Liz Miranda

História de Minas I - 40 h/a - Ricardo de Moura Faria

História de Minas II - 60 h/a - Laura Nogueira Oliveira

História da Arte - 40 h/a - Ronaldo Campos

Constituição e preservação do patrimônio Cultural - 60 h/a - Helena Guimarães Campos

Ética - 20 h/a - Ronaldo Campos

Turismo e Patrimônio Cultural em Minas Gerais - 40 h/a - Helena Guimarães Campos

Seminário de Pesquisa - 40 h/a - Júlia Calvo

Faculdade Estácio de Sá de Belo Horizonte Unidade Floresta - Av. Francisco Sales, 23 – Floresta Horário: de 9h às 11h e de 14h às 18hou pelo site http://www.bh.estacio.br/

Informações: 3279-7722
Preço: 12 parcelas de 380 reais ou 18 parcelas de 280 reais ou 24 parcelas de 230 reais.

4. Ao final deste boletim, você poderá conhecer a pesquisa de duas estudantes gaúchas, sobre a egiptomania no Rio Grande do Sul. E se você tiver uma resenha, um projeto, envie para nós, será um prazer publicá-lo. As normas foram citadas no Boletim 044.


Falam amigos e amigas

1. Ana Cláudia Vargas, mineira residente em São Paulo, nos envia esta colaboração, da revista O Berro:

A SINA DO GOLPISMO NA POLÍTICA BRASILEIRA

O texto abaixo de autoria de Mário Augusto Jakobskind sustenta uma tese para a qual devemos manter atenção segundo a qual o golpismo moralista está de volta. Toda a onda de denuncismo e de matérias produzidas para desestabilizar o governo petista, segundo o autor, é resultado de uma velha estratégia política que vem sendo praticada no Brasil há décadas. Era a estratégia golpista da velha UDN da segunda metade do século XX. Em 54 na crise que resultou no suicídio de Getúlio Vargas, em 55 na tentativa de evitar a posse de Juscelino Kubitschek, e em 61 na tentativa de impedimento de Jango Goulart estão as marcas do golpismo udenista que, finalmente, chegou ao poder em 1964 com o golpe militar.

Didymo Borges


Golpismo moralista está de volta

O Brasil continua sob o impacto das denúncias relacionadas com atos de corrupção, mas, de um geral, na cobertura midiática, lamentavelmente, predomina o espírito moralista e golpista da velha UDN, um partido que, antes de 64, sensibilizava a classe média e vivia nos quartéis conspirando. Depois de algumas tentativas frustradas - 54 (suicídio de Vargas), 55 (tentativa de evitar a posse de Juscelino Kubitschek) e 61 (renúncia de Jânio Quadros e tentativa de impedimento de Jango) - a UDN, finalmente, chegou ao poder em abril de 64. Muitos dos golpistas se arrependeram, mas aí Inês era morta. O povo brasileiro teve de suportar 21 anos de ditadura.

Alguém deve estar se perguntando: mas o que tem a ver uma coisa com a outra? Tem, sim! Claro, os tempos mudaram, a direita que quer preservar seus interesses, em detrimento da maioria do povo brasileiro, também se adaptou aos novos tempos. Não necessita mais dos militares para “manter a ordem” e prefere fazer cabeças através de lavagem cerebral mídiática do pensamento único. Colunistas amestrados estão sempre atentos e são acionados para denunciar “jurássicos” contrários aos desejos da direita. Ou seja, para se renovar de fato, o Brasil ainda precisa realizar as reformas de base, adaptadas aos tempos modernos, semelhantes às defendidas antes de 64 e que resultaram na queda do presidente constitucional João Goulart. O tema, querendo ou não os udenistas de hoje, agrupados no PSDB e PFL, continua na ordem do dia.

Em termos de Congresso, não é de agora que se escondem falcatruas para favorecer as elites dominantes há séculos, responsáveis pela situação de desigualdade social. É neste contexto que devem ser lembrados alguns fatos que caíram totalmente no esquecido baú da história. Alguns colunistas amestrados tentam convencer a opinião pública que o tal “mensalão” teve início no governo do PT. Outros preferem apontar o início, em 1998, com o então candidato a governador de Minas Gerais e hoje senador, Eduardo Azeredo. Nem uma coisa, nem outra. O velho esquema de dinheiro suspeito destinado às campanhas políticas ou mesmo para a compra de parlamentares remonta décadas passadas.

Nos tempos da ditadura, parlamentares que não se enquadrassem para manter a farsa do funcionamento do Congresso eram simplesmente cassados por 10 anos. O que havia nos bastidores em matéria de falcatrua, por exemplo, para atender os lobistas em atuação, não era divulgado. O jornal que ousasse romper o silêncio sofria punições. Por isso, a opinião pública não era informada, muito pelo contrário, os órgãos de imprensa, os mesmos que hoje fazem denúncias, comprovadas ou não, compactuavam com o regime ditatorial.

Falcatruas no Parlamento aconteciam antes mesmo de 64. Um dos fatos mais marcantes em matéria de corrupção e que caiu totalmente no esquecimento, até mesmo das teses dos senhores(as) acadêmicos(as), diz respeito a “doação” de milhões de dólares, em 1962, feitos através do denominado Instituto Brasileiro de Ação Democrático (IBAD), que de democrático só tinha o nome para iludir incautos. A ação nefasta do IBAD está documentada de forma magistral no livro “1964: A Conquista do Estado”, de autoria do professor René Dreifuss. Em 1962, às vésperas da renovação do Congresso e dos governos estaduais, o embaixador dos Estados Unidos no Brasil, Lincoln Gordon, mandava uma circular ao Departamento de Estado chamando a atenção para "o alto interesse das eleições brasileiras".

Pois bem, depois do alerta do golpista Gordon, como comprova o livro de Dreifuss, empresas como a Esso, Texaco, Shell, Bank of America, a Reader´s Digest, o próprio Departamento de Estado norte-americano e numerosos banqueiros como Olavo Setúbal, Válter Moreira Sales, Magalhães Pinto (então candidato ao governo de Minas, para o qual seria eleito), Ângelo Calmon de Sá e Herbert Levy, para não falar de empresários, nacionais e estrangeiros, que temiam as reformas de base, soltaram a grana para eleger uma bancada conservadora, que tinha por objetivo manter os privilégios dos de sempre. Um jovem economista despontava no rol dos ideólogos do IBAD, nada mais nada menos que Pedro Malan, que mais tarde, em plena democracia, veio a ser Ministro da Fazenda na gestão de Fernando Henrique Cardoso, levando adiante tudo o que a direita de antes de 64 almejava, ou seja, liquidar o Estado brasileiro, entregar de mão beijada as estatais. Um coronel entreguista, uma figura sinistra, também teve grande destaque no período: Golbery do Couto e Silva.

Entre os parlamentares que se elegeram com a ajuda do IBAD encontram-se figuras cultuadas até por setores da “inteligenzia” brasileira, como Mário Covas, posteriormente, também em plena democracia, um dos fundadores do PSDB e governador de São Paulo. Covas chegou a ser cassado em 68, por discordar dos rumos do regime ditatorial, mas nos anos 80 e 90 acabou voltando ao leito de origem do IBAD, defendendo com unhas e dentes um “choque de capitalismo” no país, ou seja, o programa posto em prática pelo delinqüente (quem entrega de mão beijada o país deve ser considerado como tal) Fernando Henrique Cardoso. Covas morreu e Geraldo Alckmin acabou se transformando no seu herdeiro político e almeja ser o Presidente da República. Alckmin quer dar um “banho de ética” no Brasil e para isso conta com a Opus Dei, o grupo extremista da Igreja Católica vinculado ao capital financeiro, o qual ele pertence, para não falar das recentes denúncias de favorecimento a correligionários de verbas publicitárias da Nossa Caixa.

Está ou não de volta a velha UDN, golpista e moralista, hoje travestida de moderna? A mesma UDN que sempre fez das suas, mas contava com o silêncio da mídia conservadora e, nos anos de chumbo, com a ajuda da censura.

O que dizer quando um ex-Presidente se refere aos pobres de forma preconceituosa, como fez o delinqüente que posa de cidadão acima de qualquer suspeita chamado Fernando Henrique Cardoso? Alguém ainda duvida que a UDN está mesmo de volta sob a égide do PSDB?

2. Professor Ricardo , parabenizo-o pelo lançamento do livro e pela criação deste espaço criado para historiadores em formato de boletim. Envio aqui uma pequena contribuição que julgo ser interessante para todos que manifestam interesse pelos destinos políticos de nosso país, como não sei colocar em blog, deixo aos seus cuidados a aprovação e a devida colocação no boletim se o senhor assim julgar pertinente. abraços. Silvana Abdalla- Goiânia-GO
Infelizmente a colaboração que a Silvana enviou era um vídeo e como meus conhecimentos de internet não são lá essas coisas... eu não sei como fazer para colocar aqui...

Brasil

Mensalão? Sanguessugas? Ora, gente, isso é café pequeno, se comparado à farra das concessões de canais de Televisão e de rádio para os ilustres e nobres parlamentares, tão éticos, tão ciosos dos valores morais... Alberto Dines, do Observatório da Imprensa, tece algumas considerações fundamentais para a compreensão dessa promiscuidade. E, como ele diz logo no início: não é para ficar procurando saber quem foi o presidente que concedeu mais, se Sarney, se FHC, se Lula. A questão é que isso NÃO pode continuar. E por que ninguém fala nada, mesmo com as denúncias da grande imprensa? Leiam o que ele tem a nos dizer.

Em seguida, José Paulo Kupfer, do site No Mínimo, comenta a tese do economista Marcelo Néri, mais uma das muitas tentativas de compreender este nosso país...

No terceiro artigo, o jornalista Mylton Severiano comenta o número especial da revista Caros Amigos dedicado à investigação sobre o PCC. O mais trágico, a meu ver, é o que foi dito pelo delegado Cosmo: os verdadeiros cabeças do tráfico estão acima da lei. Ele sabe, o que quer dizer que os órgãos de segurança sabem quem são os poderosos traficantes, mas não diz. E nem os prende. Onde vamos parar?

1. CORONELISMO ELETRÔNICO

Folha desmascara trambique e ninguém se mexe
Por Alberto Dines em 20/6/2006

É irrelevante, deletéria e falaciosa a disputa para saber qual o governo que mais concessões para rádios e TV distribuiu aos parlamentares. Não importa se o campeão desta modalidade inconstitucional foi FHC ou é Lula. O que importa é a identificação do ilícito e a interrupção imediata deste tipo de cambalacho político.
Da mesma forma, não interessa saber qual foi o governo mais condescendente com o crime organizado. Interessa montar imediatamente uma frente política para enfrentar a insurreição instalada no sistema prisional do país.
Câmara ou Senado não mexerão uma palha para acabar com a calamitosa promiscuidade que converte legisladores (teoricamente, fiscais das concessões) em concessionários de serviços públicos. Como escreveu
Fernando Rodrigues (Folha de S.Paulo, 19/6, pág. 2) esta é "uma das formas mais explícitas do atraso institucional brasileiro".
No dia anterior (domingo, 18/6), por intermédio da repórter
Elvira Lobato, mesma Folha novamente denunciou o calamitoso conflito de interesses em manchete da primeira página e mais três do noticiário político.
Promiscuidade explícita
Não adianta convocar CPIs, não há deputados íntegros em número suficiente para investigar o abuso dos colegas e mostrar como este tipo de concessão contamina e compromete a mídia brasileira.
O Conselho de Comunicação Social, como órgão auxiliar do Congresso, poderia iniciar o desmonte desta máquina corruptora. Mas o Conselho de Comunicação Social ficou engavetado 12 anos consecutivos porque sua instalação não interessava ao vice-rei José Sarney; e quando o CCS finalmente começou a funcionar, o imortal deu um jeito para colocar na presidência do órgão seu assecla Arnaldo Niskier. Resultado: o Conselho desapareceu do mapa institucional brasileiro apesar de previsto na Constituição.
Este Observatório da Imprensa ofereceu à Procuradoria Geral da República, em outubro de 2005, valiosos subsídios produzidos ao longo de meses de investigações e cruzamento de dados [
ver aqui a íntegra da representação]. A PGR acolheu-os, estuda a forma legal para implodir o sistema.
E por que razão o tonitruante Estadão-ão-ão, que se preocupa tanto como a Folha com a questão da mídia eletrônica, não segue a trilha do concorrente? E por que se cala a Associação Nacional de Jornais, que deveria estar na linha de frente desta cruzada para moralizar a concessão de canais de rádios e TV?
Deveria, mas não está. E não está porque grande número de jornais regionais foi beneficiado pelo "mensalão eletrônico" instituído quando José Sarney era o presidente da República e Antonio Carlos Magalhães, seu ministro das Comunicações. Quanto mais parlamentares participarem do trambique das concessões, mais garantida estará a continuidade do sistema. Um jornal provincial só sobrevive se consegue controlar algumas rádios e associar-se a uma repetidora das redes nacionais de TV. Este é segredo da perenidade do sistema.
Não há a menor dúvida: a promiscuidade entre políticos e a comunicação social é uma das expressões mais visíveis da nossa tragédia institucional.


2. José Paulo Kupfer, do site NoMinimo – Mais com menos

Quando se fala no cruzamento de crescimento e distribuição de renda, a literatura econômica, inclusive a mais recente, tem bons exemplos para todos os lados. Há casos de economias que crescem rápido com má distribuição e de outras que crescem pouco – ou nem crescem – com redução das desigualdades, sem falar nas diversas combinações possíveis entre esses dois extremos, todas comprováveis em situações empíricas.

O Brasil, que é o caso emblemático mundial de desigualdade social – como a África do Sul é o caso emblemático de discriminação racial e a Índia, de pobreza –, se candidata a acrescentar uma combinação pouco usual aos abundantes estudos sobre o tema. No Brasil dos primeiros anos do século 21, mesmo com queda na renda per capita, a desigualdade diminuiu. O paradoxo está devidamente destrinchado num trabalho recente do economista Marcelo Néri, chefe do Centro de Políticas Sociais, da FGV-Rio, em associação com dois pesquisadores do International Poverty Centre, da ONU, acessível em www.fgv.br.

Sob o título “Crescimento pró-pobre: o paradoxo brasileiro”, o estudo mostra que, embora a renda per capita tenha recuado a uma taxa média anual de 1,35% entre 2001 e 2004, a taxa de crescimento pró-pobre chegou a 3,07%. Um bom exemplo do que isso quer dizer pode ser obtido nos dados de 2004, quando os índices de desigualdade atingiram os níveis baixos em 30 anos. Enquanto a renda média do brasileiro cresceu 3,6%, a dos pobres aumentou 14,1% – “como se os mais pobres tivessem vivido o esplendor econômico de uma China”, lê-se no estudo.

No conjunto da economia, a participação dos 50% mais pobres no total da renda, entre 2002 e 2005, apresentou um aumento de 20%, passando de 10,07% do total para 12,24%. No mesmo período, a participação dos 10% mais ricos na renda total caiu de 50,1% para 47,27% – recuo de 6%. Nas faixas intermediárias de renda, houve melhoria, mas menor, em torno de 10%. Detalhe: em 2005, quando o ritmo de redução da desigualdade perdeu um pouco de fôlego, os mais ricos continuaram perdendo e os intermediários ganharam mais do que os mais pobres.

Na economia brasileira do século 21, a renda do trabalho, em anos de crescimento mais expressivo, tem um efeito importante na redução da desigualdade. Foi o que ocorreu em 2004. Naquele ano, o de menor índice de desigualdade em três décadas, como já se mencionou, ela respondeu por mais de 70% da redução da desigualdade. Nos demais períodos, a desigualdade diminui pelo efeito das transferências de renda da previdência e das bolsas sociais. “O efeito-bolsa família”, anota o estudo da FGV, corresponde a dois terços do crescimento pró-pobre observado de 2001 a 2004.”

Atenção: os reajustes no salário mínimo desempenham papel de altíssima relevância em qualquer das circunstâncias que favoreçam a melhora na distribuição de renda. Ele atua não só empurrando os pisos salariais para cima, mas também na ampliação automática e compulsória nos programas de transferência de renda, como lembra o estudo da FGV, ao indexar benefícios e critérios de elegibilidade, particularmente na Previdência Social, no seguro-desemprego, na Loas (lei de assistência social aos pobres idosos).

Além de fulminar tão conhecidas e insistentes tentativas “científicas” de negar os óbvios benefícios dos programas sociais afirmativos, o estudo da FGV tem a inestimável vantagem de deixar sem argumentos quem quiser aparecer como dono da boa novidade da redução das vergonhosas desigualdades brasileiras. Se, como prova o estudo, os efeitos sociais positivos das políticas de transferência aceleraram com Lula, a base para isso veio de antes, dos tempos de FHC. Data de 1998, por exemplo, a decisão pró-pobres de garantir reajustes maiores aos benefícios previdenciários das faixas mais baixas.

O problema é que, sem mudar o desenho com que foram concebidos lá atrás, quanto mais os programas sociais avançarem, mas curto será seu fôlego. É possível reduzir desigualdades sem crescimento, mas não para sempre. Enquanto as despesas com juros consumirem a melhor parte dos esforços fiscais, restringindo o crescimento, os limites para a expansão dos gastos sociais serão lamentavelmente estreitos.

3. Circo de horrores
por Mylton Severiano (do Correio Caros Amigos)

A primeira edição extra de Caros Amigos, 28 de maio de 2006, dedicada ao PCC, Primeiro Comando da Capital, arrepia. Pasma constatar: quase 250 anos depois da publicação de Dos Delitos e das Penas (1764), nosso sistema carcerário e o aparato ideológico que o envolve parecem reportar-se ainda ao Código de Hamurabi e à Lei de Talião (2000 a.C.).

Sempre temos notícias de que nossas prisões são cruéis. Mas não imaginamos o quanto. Cadeia não foi feita pra cachorro, diziam nossos avós. Em Dos Delitos e das Penas, Cesare Beccaria, o marquês de Beccaria, filósofo e jurista italiano (1738-1794), pregou a humanização da pena. Ela não deve exceder a privação da liberdade – quer pior pena que ser privado da liberdade? Há dois séculos e meio, o jurista e professor de direito milanês pregava a educação como prevenção do crime. Um marco na moderna história do direito.

Contudo, o que salta dos relatos de João de Barros, Marina Amaral, Roberto Manera e Thiago Domenici, nessa edição extra, são torturas, humilhações, cães ferozes a morder presos nus (sob comando do atual deputado estadual Conte Lopes), trabalho escravo, processos “kafkianos”. Prendem mãe que furtou manteiga ou remédio para o filho (furto famélico) e deixam à solta sonegadores de milhões de reais. Mantêm gente amontoada – e há dezenas de milhares de mandados de prisão só em São Paulo: precisariam triplicar o número de cadeias! Salta aos olhos que a cadeia e as forças repressoras mal contêm a “formatura” anual de cada vez mais levas de “bandidos”, caso não se estabeleçam urgentes mecanismos de distribuição de renda.
Há gente literalmente mofando, novatos misturados a reincidentes; cafuas 22 horas por dia; transferências ilegais para longe das famílias, surras com barra de ferro; rés primárias “enterradas em pé”. O inferno é aqui, para os presos pobres.

Não fosse o PCC, a situação estaria pior, não é incrível? Organizaram os presos na luta por seus direitos e impediram mortes entre eles, dentre outras coisas. E um desembargador, cujo nome o ex-secretário de Segurança de São Paulo, Marcos Vinicius Petreluzzi, omite na entrevista ao João de Barros, sugeriu que é fácil acabar com o PCC: “pegar o líder e pôr numa cadeia dominada por outra facção, eles matam o cara rapidinho”. Um desembargador! Um juiz! O próprio secretário atual, Saulo de Castro, adota o lema “bandido bom é bandido morto e enterrado na Lua”. O delegado Ruy Ferraz Fontes, do Deic, Departamento de Investigações sobre o Crime Organizado, ante-sala do inferno, inscreveu na porta de seu gabinete: “Direitos humanos para os humanos direitos.”

Deve se achar o máximo! E até comunicador pensa e propaga este sofisma idiota. Devem pertencer esses, desembargador, delegado, secretário, comunicador, à “elite branquinha”, apontada pelo governador Cláudio Lembo como responsável pelo maio sangrento. (O Cláudio Lembo, quem diria. Comprova que se pode encontrar gente não tão má no inferno como gente não tão boa no céu.)

Pergunto: tal como os delinqüentes “de fato”, esses delinqüentes “de direito” não deveriam, como pregou Beccaria, ser reeducados? Em que faculdade estudaram? Que professores lhes ensinaram? A OAB, Ordem dos Advogados do Brasil, que os aprova, não lhes examina o caráter? São mais obtusos e sem entranhas que muito bandido.

E o circo de horrores que a PM patrocinou em seguida ao ataque do PCC? Média de quinze mortes por noite, à socapa. Anunciadas pelo major Sérgio Olímpio Gomes, diretor da Associação de Oficiais da PM, às claras, em entrevista ao Globo: “Vai morrer uma média de dez a quinze bandidos por dia a partir de agora.” Bandidos? Garotos, entregador de pizza, namorado à espera da namorada, cabeleireiro a fechar as portas com medo, mãe de preso ligado ao PCC cuja casa invadiram. Tiros nas costas, na nuca. Coisa de bandidos. Que PM!

Agiram pior os “homens da lei”. Tanto na ação covarde ao matar inocentes, quanto, pior ainda, por serem agentes do Estado. Lei de Talião – olho por olho, dente por dente. Anti-Cristo.
Choremos uma nênia pelos mortos de todos os lados, inocentes úteis ou inúteis desta engrenagem infernal que a “elite branquinha” montou e celebra em tintins.

A PM, em alguns Estados, não há mais quem controle. Peço sempre às forças superiores que me livrem de bandido. Com fervor redobrado peço me livrem de peeme. O melhor seria extinguir a PM. Não os peemes, claro. O povo agradeceria. Que é contra o povo que se voltam. Há lugar para todos neste mundo de Deus.

Isto daria um livro. Por ora, o que se depreende dos fatos e da leitura desse número extra são duas medidas para minorar o sofrimento do povo: fim da PM; legalização das drogas ilícitas. Chutando, um terço da massa carcerária é pobre-diabo, pobre-diaba apanhados vendendo trouxinha de maconha, sacolé de coca. E prisão custa “uma fortuna”, diz Petreluzzi:
“O dia em que a droga voltar a ser um caso de saúde pública, você acaba com a droga ilegal.”
E já esvaziaria prisões. O delegado Cosmo Stikovicz diz que nem poderia dizer o nome dos cabeças do “tráfico”, senão seria processado. Quem são os “patrões”?
“Se eu dissesse os nomes de alguns desses suspeitos, você cairia para trás”, declara Cosmo. E esses estão acima da lei.

Por que Cosmo não diz? Aceitaria depor numa CPI?

Há muitas questões explosivas nesse número extra da Caros Amigos. Um banho de jornalismo. Daria um livro-reportagem.
Mylton Severiano é jornalista.

Nuestra América

Esta charge é realmente muito sarcástica...

Os estudantes do Chile, quem diria...aprontaram uma boa para cima da presidenta recentemente eleita... Nem tudo está perdido neste mundo... Ainda há vozes que clamam contra o neoliberalismo. O artigo do historiador Mario Maestri é bem interessante:

A Batalha do Chile

Mário Maestri (do site www.NovaE.inf.br)

Chile tem sido a grande vitrine das políticas neoliberais. Uma situação alcançada com o golpe de 11 de setembro de 1973 que transformou, com o massacre e a repressão do movimento social, o país no primeiro laboratório das receitas conservadoras que se derramaram a seguir sobre o mundo. Para tal, as conquistas sociais, as organizações populares, os partidos de esquerda foram destruídos e a saúde, a educação, a segurança social e as empresas públicas, privatizadas. A liberalização da legislação trabalhista, fiscal e tributária facilitaram ao extremo a circulação de capitais e mercadorias.
A operação neoliberal teria produzido resultados excelentes, apesar de Chile ter-se desindustrializado e multidões de nacionais abandonado o país por razões políticas e econômicas. Em inícios de 2006, a dívida, a inflação, os juros e o desemprego prosseguiam baixos. As exportações de cobre, peixe, frutas, celulose e vinho – mais de 50% do PIB – avançavam de vento em popa, ajudadas pela assinatura de um tratado de livre comércio com o USA, em 2004. O preço do cobre nas alturas enchia as burras do Estado. O balanço político era também supimpa. A gestão conservadora de Ricardo Lagos, primeiro presidente socialista após a ditadura, fora referendada com a eleição de Michelle Bachelet, outra socialista amorosa da sociedade de mercado.
A obra magna do Chile neoliberal era porém a destruição do projeto histórico construído através de décadas de lutas por uma das classes trabalhadoras mais conscientes do mundo. Uma herança pinochetista preservada com carinho, após 1990, pelos governos democrata-cristãos e socialistas da Concertación Democrática. A longa noite da ditadura teria soterrado para sempre as certezas que partejaram o governo da Unidade Popular, em 1970. Uma juventude chilena individualista, despolitizada e consumista seria a pedra angular do Chile novo, paradigma mundial de sociedade de mercado.
A mobilização dos secundaristas nasceu nos três ou quatro melhores liceus públicos de Santiago e estourou como um inesperado raio em céu sereno. Muito logo, ganhou os mais de trezentos colégios secundários da capital e, a seguir, o país. Os presidentes dos centros de alunos dos colégios envolvidos na mobilização formaram uma Assembléia Coordenadora dos Estudantes Secundários, com seis porta-vozes: dois estudantes comunistas, dois socialistas e dois conservadores, também favoráveis à escola pública.
Fortalecido, o movimento lançou duas poderosas greves nacionais, em 30 de maio e 5 de junho, pondo inapelavelmente por terra o projeto de manutenção da Lei Orgânica Constitucional do Ensino, ditada por Pinochet no último dia de ditadura. Em verdade, os secundaristas chilenos fizeram muito mais. Com a multitudinária ofensiva trincaram profundamente a pesada teia ideológica que envolve a sociedade chilena, imobilizando-a com a falsa idéia de que as instituições capitalistas, mesmo não sendo desejáveis, seriam as únicas possíveis.

Chile profundo

Os resultados macro-econômicos escondem sociedade dura, brutal e desigual. No Chile, os direitos de greve e sindicalização são limitados e os salários, baixos. Dominam o trabalho part time e os contratos precários. A jornada laboral é de 48 horas, uma das mais altas do mundo. A saúde, previdência, educação, lazer, segurança privatizadas corroem economia familiar vergada pelo endividamento bancário. Quarenta por cento e cinco da população vive na pobreza. A educação secundária é exemplo da triste realidade do país. Antes do golpe, o ensino estatal encontrava-se entre os melhores da América Latina. Com a ditadura, as escolas públicas, destino da maior parte dos estudantes, foram municipalizadas e entregues a sua sorte. Ao contrário, o ensino privado pago, destinado às classes médias, passaram a ser financiadas pelo Estado. Finalmente, consolidaram-se colégios extremamente caros para os filhos dos grandes proprietários. Nesse sistema de castas sociais, o estudante de escola privada pode custar quatro vezes mais ao Estado do que o de colégio público.
A diversidade entre a escolarização do estudante pobre e do rico garante o monopólio à universidade, também fortemente privatizada, aos segundos. Não mais de cinco por cento dos alunos chegados das escolas públicas vencem a Prova de Aptidão Acadêmica que, há poucos anos, passou a exigir taxa de inscrição de uns setenta reais. A deterioração da educação comprometeu a própria produtividade do trabalhador, para o horror do empresariado. Para não tocar o princípio da divisão classista do ensino, o presidente socialista Lagos empreendeu reforma da educação descolada da realidade social. Determinou escolarização obrigatória de doze anos e maior permanência dos alunos nas escolas, sem realizar os investimentos exigidos pelas medidas.
Não houve financiamento da passagem escolar para os alunos dos anos superiores, recaindo o custo da passagem sobre a economia familiar. Não se compensou a retenção na escola de jovens que contribuíam para a frágil renda família. Os colégios públicos permaneceram sem refeitórios, salas de aulas, bibliotecas, etc., apesar de fortemente exigidos pelo acréscimo da jornada e dos anos de escolarização. Enfrentava-se a crise da educação enjaulando o estudante pobre em escolas decaídas.
Os estudantes chilenos possuem riquíssima tradição de luta. Secundaristas e universitários morreram às centenas combatendo o golpe e a ditadura. Nos últimos anos, jamais deixaram de empreender duras mobilizações de vanguarda por melhores condições de ensino, pelos direitos democráticos e sociais, em defesa da memória das lutas populares. O governo Lagos neutralizou a mobilização estudantil fortalecida por sua reforma estabelecendo “mesas de diálogo” onde, um pouco como na Revolução Francesa, os estudantes definiram suas reivindicações mínimas e afinaram as lideranças.

Começar novamente

Michelle Bachelet desconheceu simplesmente a elaboração das “mesas de diálogo”. Inicialmente, o governo limitou-se a reprimir as primeiras mobilizações dos liceus mais politizados da capital, esperando que a luta não se espraiasse. As reivindicações de transporte livre, gratuidade do vestibular e estatização das escolas municipalizadas conquistaram a adesão de praticamente todo o ensino público e o apoio popular. Alunos de liceus privados envolveram-se na luta reunindo alimentos, participando de reuniões nas escolas ocupadas, etc. O ensino privado pesa também no bolso das famílias de classe média, sobretudo se possuem mais de um filho. Nos bairros próximos aos liceus ocupados, donas de casa bateram forte nos fundos de panelas, em cacerolazo plebeu que recorda as lutas sociais quando da Unidade Popular.
O governo entregou a questão secundarista a Martín Zilic, ministro da Educação que, após negar-se a discutir com os alunos mobilizados, convocou seus delegados, sem no entanto recebê-los. A repressão policial e prisão de milhares de estudantes renderam também escassos frutos. Os confrontos entre jovens e carabineiros acirraram-se, sobretudo no centro de Santiago. Combateu-se duramente na avenida Bernardo O'Higgins, palco histórico das refregas estudantis, onde, em 17 de junho de 1973, jovem gaúcho Nílton Rosa da Silva, o Bem Bolado, estudante de Letras do Instituto Pedagógico, foi morto por bala fascista, sendo acompanhado em sua última caminha por dezenas de milhares de santiaguinos.
Michelle Bachelet mergulhou em profundo mutismo, esperando que os secundaristas esquecessem que tinha nas mãos a solução do problema. Durante as eleições, seu mote de campanha fora “Bachelet: estou contigo!” Nas fachadas dos liceus ocupados, dependuraram-se, aos milhares, cartazes com a incômoda pergunta: “Bachelet, estás comigo?” A greve geral de 30 de maio, com mais de seiscentos mil estudantes, seguida de mobilizações e confrontos nas principais cidades, obrigou finalmente a presidenta a conceder, na quinta-feira, 1º de junho, largamente, parte das reivindicações estudantis.
Por televisão, Bachelet anunciou a gratuidade, para estudantes pobres, do vestibular e da passagem; bolsas para mais de 150 mil estudantes; aumento de duzentas mil refeições diárias; melhorias em meio milhar de liceus. Pediu o fim da mobilização e anunciou o estabelecimento de “Conselho Assessor Presidencial em Educação”, claramente sob a hegemonia conservadora, de 66 membros – apenas seis secundaristas e seis universitários –, integrado também por delegados dos professores e proprietários de escolas, para discutir a reforma da educação.
As mobilizações chilenas foram influenciadas pelas jornadas da juventude francesa contra a precarização do contrato juvenil de trabalho. Na França, a convergência entre a luta juvenil, popular e operária ensejou vitória total de movimento defensivo contra a reforma neoliberal. No Chile, tratou-se de ofensiva antiliberal, para ampliar o espaço público e fazer retroceder o privado, que conquistou os estudantes universitários e a simpatia e o apoio da população. A mobilização não teve porém força para arrastar o movimento operário que ainda se recupera da desestruturação conhecida no passado.
Mais público, menos privado
A segunda greve geral, de 5 de junho, exigia a maioria estudantil em Conselho Assessor de caráter decisório, a generalização das concessões acordadas, a responsabilização pelo Estado do ensino público. Com seiscentos mil secundaristas e trezentos mil universitários, recebeu o apoio, sobretudo político, de mais de cem organizações sindicais e sociais que, em alguns casos, interromperam o trabalho por duas horas. Nas marchas que percorreram as capitais participaram professores e funcionários públicos. Na cidade portuária de Valparaíso, entre os doze mil manifestantes, encontravam-se trabalhadores portuários, da construção, dos serviços públicos. O governo, a mídia e as organizações patronais denunciaram a instrumentalização da luta estudantil pelo sindicalismo classista, como se a luta dos filhos não dissesse respeito aos pais!
A consolidação do domínio neoliberal no Chile mantém devido sobretudo à destruição da unidade do mundo do trabalho, materializada, no plano sindical, na eclipse da já monolítica Central Única dos Trabalhadores e, no plano político, na ruptura da aliança histórica entre socialistas e comunistas. A reconversão neoliberal dos socialistas, que deram as costas ao velho aliado comunista para abraçar-se no tradicional inimigo democrata-cristão, comprometido no golpe militar, permitiu prosseguir e aprofundar as receitas neoliberais e manter na marginalidade o Partido Comunista.
Os secundaristas realizaram a maior greve desde o golpe, obtiveram conquistas substanciais, ganharam a população para a reivindicação de mais público e menos privado. Nos momentos finais da luta, demarcaram a importância da convergência de estudantes, populares e trabalhadores. Assentaram duríssimo golpe no edifício neoliberal, registrando a necessidade de direção política autônoma e classista. No momento em que as forças neoliberais propunham soberbas a vitória na batalha do Chile, a juventude popular chilena, sem medo e com decisão, assinalou com conquistas sociais irretorquíveis que apenas começou a lutar!
Mário Maestri, 58, historiador, estudou em 1970-3, no Curso de História do Instituto Pedagogico da Universidad de Chile

Cinema
Cachê (colaboração do prof. Antônio de Paiva Moura)

Filme francês. Direção de Michael Hanek.

Uma família constituída por um professor universitário e uma funcionária da mesma instituição. Tinha um filho de 12 anos que praticava natação e competia com regularidade. Tudo ia muito bem até que a referida família percebe que está sendo espionada por alguém. O episódio é comum e qualquer cidade grande do mundo poderá ocorrer fato semelhante. Mas o que é notável no filme é a simbologia das imagens, cenas e ambiente. Os significados e os significantes giram em torno da modernidade contemporânea. Começa com o fato de ter um único filho; marido e mulher vivem juntos só por causa do filho; vida rotineira e ambiente de trabalho; ambição de ser; mulher idosa que se conforma com a solidão. O filme todo é rodado na penumbra e com raros flashes de luz, simbolizando a angustia, a solidão e a incógnita de cada personagem; a obscuridade de nosso tempo. As farpas e as tensões entre o casal são angustiantes. Simbolizam a falta de conhecimento e a surpresa da vida. Um grupo de funcionários amigos do casal, porém de status inferior revela descontração e alegria: brinca, conta piada e solta gargalhada.
Outros símbolos são estampados no aparecimento dos arranha-céus: o uso de gins; um carro para cada um; trânsito intenso; preconceito contra os argelinos; ambição pelo dinheiro; ambição pelo ser; ambição pelo conhecimento. Estamos condenados a viver sob a camisa de força da modernidade. O personagem principal chega em casa, toma dois comprimidos de lexotan. Remoendo a ansiedade para dormir, deita sozinho em um lado da larga cama.
É claro que muitos significados do filme escaparam-me. Se você for assisti-lo poderá captura-los para animar nosso próximo dedo de prosa.


Livros e revistas

1. Revista USP nº 68 – traz um amplo dossiê sobre o Racismo e artigos sobre o escritor Erico Veríssimo, abordando temas como a relação de sua obra com o golpe de 1964.

2. A guerra das imagens, de Serge Gruzinski (Cia. Das Letras, 368 p. $ 51), analisa o imaginário como instrumento de dominação no México, desde o período colonial aos nossos dias.

Notícias

1. Prêmio de R$ 50 mil para o melhor livro sobre vinda da Família Real ao Brasil
O Município do Rio de Janeiro criou o Prêmio D. João VI, a ser concedido em 2008, para comemorar o bicentenário da chegada da Corte de Portugal ao Brasil. De acordo com a Secretaria Municipal das Culturas, o autor do melhor livro inédito que tenha como tema o impacto da presença da Família Real sobre a cidade do Rio de Janeiro receberá R$ 50 mil.As inscrições estarão abertas até 21 de dezembro de 2007 e os originais deverão ser apresentados na sede no Palácio da Cidade, em Botafogo. O concurso é um dos muitos eventos que Prefeitura promoverá em toda a cidade para comemorar o bicentenário.

2. A Revista Esboços, periódico do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Santa Catarina, me incumbiu da tarefa de ser a organizadora do dossiê " História: entre a saúde e a doença", a ser publicado no segundo semestre de 2006. Para tanto, venho convidá-los a contribuir com um artigo de sua autoria (traduções, entrevistas que julguem relevante etc.) que deverá ser enviado até o dia 10 de outubro de 2006, de acordo com as normasanexadas.

Este número pretende reunir artigos que tenham como objeto de pesquisa:

* os processos de cura e prevenção de doenças

* meios de manutenção da saúde

* instituições de tratamento e atuação de agentes na área da saúde

* medicinas alternativas, complementares e tradicionais

* paradigmas e discursos sobre corpo, saúde e doença

* movimentos populares, organizações e associações envolvidas com os processos de saúde e doença

Grata pela atenção,

Profa. Dra Renata Palandri Sigolo(rpalandri@hotmail.com)Pós-graduação em História da Universidade Federal de Santa Catarina

Informe da ANPUH – Nº 10/2006


1. EVENTOS

(a) Lembramos que já está disponível a Primeira Circular do XXIV Simpósio Nacional de História da ANPUH, que acontecerá na UNISINOS, em São Leopoldo, Rio Grande do Sul, entre os dias 15 e 20 de julho de 2007.
(b) Veja também a Primeira Circular do VI Encontro Regional de História da ANPUH-ES. O encontro, cujo tema central é: “Territórios e fronteiras: limites e deslocamentos”, ocorrerá entre os dias 7 e 10 de novembro de 2006, na UFES. As inscrições para apresentação de trabalhos se encerram no dia 31/8.
(c) Informamos que a inscrição para lançamento de livros e revistas durante o I Encontro Nordestino de História Colonial está com inscrições abertas até o dia 15 de agosto de 2006, somente por via eletrônica, através do formulário em formato DOC que segue em anexo, e que deve ser preenchido e enviado pelos interessados, juntamente com uma imagem da capa do livro / revista (formato JPG, 300dpi, largura máxima de 6 cm/ ) para o endereço enhc2006@uol.com.br


2. CHAMADA PARA PUBLICAÇÃO DE ARTIGOS
(a) Ágora - Revista de História e Geografia da Universidade de Santa Cruz do Sul - está aceitando artigos para integrar o v. 12, n. 1 - jan./jun/ 2006. A temática é EMIGRAÇÃO, IMIGRAÇÃO E COLONIZAÇÃO. Os textos devem ser encaminhados até 30 de junho para: Editoria da Ágora - Departamento de História e Geografia da Universidade de Santa Cruz do Sul. Caixas Postais 188 e 236. Av. Independência, 2293 - Bloco 5, Sala 506 96815-900 - Santa Cruz do Sul- RS – Brasil - E-mail: agora@unisc.br
(b) A revista eletrônica Cadernos de História: publicação do corpo discente do departamento de história da Universidade Federal de Ouro Preto está recebendo trabalhos para publicação de seu segundo número até 30 de julho de 2006. As colaborações podem ser feitas em forma de artigo inédito, entrevista, resenha crítica, transcrição comentada de documento inédito e tradução de textos inéditos em língua portuguesa ou nova tradução que se justifique pelo trabalho crítico. Maiores informações no site: www.ichs.ufop.br/cadernosdehistoria ou pelo e-mail cadernosdehistoria@yahoo.com.br

3. LANÇAMENTO DE LIVROS

(a) O Departamento de História da UFMA e a ANPUH-MA convidam para o lançamento do livro "Meandros da História: trabalho e poder no Grão-Pará e Maranhão - séculos XVIII e XIX", com a participação dos autores Benedito Souza Filho, Josenildo Pereira, Luiz Alberto Ferreira, Manoel de Barros Martins e Regina Faria, e com a presença do professor Maturo Coelho, da equipe de organizadores da coletânea. A obra recupera uma parte do passado histórico do Norte do Brasil. Dia 21/6/2006, às 18h, no Palácio Cristo Rei, Praça Gonçalves Dias, São Luís, Maranhão.

(b) A EDUFES e o PPGHIS/Ufes comunicam o lançamento da obra História, Mulher e Poder, organizada pelos professores Gilvan Ventura da Silva, Maria Beatriz Nader e Sebastião Pimentel Franco. O livro pretende contribuir para o debate historiográfico que busca compreender as relações de gênero sob a ótica das relações de poder e reúne textos de especialistas no assunto oriundos de diversas universidades brasileiras. Os interessados podem adquirir os exemplares por meio do telefone (27) 3335-2370 (falar com as Sras. Élia ou Sandra) ou do e-mail ediufes@yahoo.com.br
(c) Foi lançado o livro “O Sexo Devoto: normalização e resistência feminina no Império Português XVI –XVII” (Recife: Editora Universitária - UFPE, 2005, 372p) que traz uma abordagem histórica sobre a condição feminina no Império Português. A autora é Suely Creusa Cordeiro de Almeida, da Universidade Federal Rural de Pernambuco.

4. OUTROS
Comunica-se a criação do Labeca, Laboratório de estudos sobre a cidade antiga, no Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo. Esse espaço de pesquisa está inserido no Projeto Temático Fapesp "Espaço e sociedade na Grécia Antiga. Organização do espaço e sociedade", coordenado pelas profas. Maria Beatriz Borba Florenzano e Elaine Farias Veloso Hirata, e congrega pesquisadores de São Paulo, do Rio de Janeiro e de Porto Alegre.O Labeca foi criado em 2006 como um espaço de pesquisa e formação de Arqueologia Clássica. Seus objetivos são criar instrumentos metodológicos que permitam chegar a uma compreensão aprofundada de como ocorrem as relações entre ambiente construído e sociedade na Grécia antiga. Para contatos, utilize o e-mail labeca@usp.br

Divulgue sua pesquisa.

Quem nos enviou esta semana foram as estudantes gaúchas Egiselda Brum Charão e Cleunice Maddeise dos Santos Corrêa, orientadas pela profª Drª Margareth M. Bakos, da PUC-RS.

IMAGINÁRIO SOCIAL: Exemplos raros e preciosos de egiptomania
(Rio Grande do Sul – Séculos XX e XXI)

Egiselda Brum Charão*
Cleunice Maddeise dos Santos Corrêa**

Esta pesquisa tem por objetivo estudar e analisar os propósitos e os procedimentos empregados no processo de apropriação de elementos da cultura egípcia antiga utilizados na atualidade. Inicialmente os casos e exemplos os exemplos selecionados foram: 1)Centro Espiritualista de Umbanda Esotérica São Francisco de Assis; 2)Bar e Danceteria Enigma Show: 3) uma tatuagem do Olho de Horus; 4) Hórus Ferragem



O suporte metodológico desta pesquisa pode ser melhor compreendido através do emprego e conhecimento do conceito de transculturação que significa a apropriação de elementos de uma cultura por outra. Tal aspecto implica normalmente em mudança cultural e transformação de conteúdo ou expressão. No entanto, estes fenômenos via de regra, não são compreendidos e avaliados do ponto de vista científico e cultural.
Os casos abordados e os exemplos apresentados nesta pesquisa já são familiares e se encontram no nosso universo cotidiano. A idéia de estuda-los surgiu quando tomamos contato com o projeto de pesquisa Egiptomania no Brasil séc. XIX e XX coordenado pela Prof. Dra. Margareth M. Bakos[1] desde o ano de 2001 e que está sendo realizado no Centro de Pesquisas Históricas da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul com o apoio do CNPq.
Antes de mais nada, é preciso compreender que esse interesse pelo Egito se apresenta por meio de três diferentes formas: 1) pela “egiptofilia”, exotismo e pela posse de objetos relativos ao Egito antigo; 2) pela “egiptomania”; que é a reinterpretação e o re-uso de traços da cultura do antigo Egito, de uma forma que lhe atribua novos significados; e, finalmente, 3) pela “egiptologia”, ramo da ciência que trata de tudo aquilo relacionado ao antigo Egito.[2]
Conforme o projeto citado buscamos conhecer os motivos e procedimentos patenteados por estes modos de adaptação cultural em seus diversos âmbitos e ângulos de manifestação tais como, na arquitetura e decoração, nos locais de devoção , designações comerciais e adornos físicos.
Em vista disso estabeleceram-se os seguintes passos metodológicos para o desenvolvimento da investigação: entrevistas com os proprietários e idealizadores das casas e estabelecimentos que apresentam imagens da cultura egípcia antiga, aplicação do questionário ampliado constante no site do projeto, registro fotográfico de imagens internas e externas dos prédios, registro fotográfico dos adornos corporais, estudo dos depoimentos e imagens segundo metodologia de análise de conteúdo de Ciro Flamarion Cardoso, avaliação dos discursos e das representações, enfocados primeiramente no agente emissor.
[....No entanto, apesar da tendência do século XIX a opor “material” a “ideal”, o século XX desembocou, pelo contrário, na demonstração de que ambos os termos são inseparáveis.][3]

CONSIDERAÇÕES

Através da análise do corpus documental e das entrevistas, ficou constatada a prática de egiptomania nos casos acima estudados que comprova a apropriação de elementos da cultura egípcia antiga bem como a utilização dos mesmos para o lazer, a reflexão, o comércio, e a vaidade pessoal, evidenciando um processo de transformação baseado inicialmente, no conhecimento empírico dos agentes emissores.
Assim, pode-se afirmar, como resultado parcial da investigação aqui proposta que a adequação dos elementos culturais citados, remete, antes de tudo, a um imaginário popular que, inicialmente é construído através do saber derivado de experiências vivenciadas. Para dar continuidade a esta pesquisa e ampliar as possibilidades de interpretação dos casos em avaliação, deve-se, sobretudo, estudar e analisar os agentes receptores.

Referências Bibliográficas

BAKOS, Margaret M. Egiptomania. O Egito no Brasil. S.P. Paris, 2004.
BACZKO, B. Imaginação Social, Encicl. Einaudi, v. V
BERND, Zilá.(org) Americanicidade e transferências culturais. POA, Movimento. 2003
CARDOSO, Ciro Flamarion. Análise de conteúdo: método básico. Mimeo. 2005.
www.pucrs.br/ffch/historia/egiptomania


* Egiselda Brum Charão, acadêmica da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do
Porto Alegre. RS. 2006
** Cleunice Maddeise dos Santos Corrêa acadêmica da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Porto Alegre. 2006
[1] Doutora em História pela USP. Pós-Doutorada em Egiptologia no University College London. Professora Adjunta da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Coordenadora do Projeto de Egiptomania no Brasil(CNPq)
[2] BAKOS, Margaret. Org. Egiptomania o Egito no Brasil. Paris. São Paulo, 2004. p.10
[3] CARDOSO, Ciro Flamarion. Análise de conteúdo: método básico.
Mimeo. 2005.


0 Comentários:

Postar um comentário

Assinar Postar comentários [Atom]

<< Página inicial